domingo 06 2025

A verdadeira história e significado do fascismo

Você, assim como eu, já deve ter se cansado de ver a palavra “fascista” ser usada de forma distorcida, leviana e até ofensiva — muitas vezes, sem qualquer relação com seu verdadeiro significado histórico. O uso indiscriminado desse termo, sobretudo em debates políticos nas redes sociais, é um grave sintoma do esvaziamento dos conceitos. Para honrar a memória daqueles que sofreram sob regimes fascistas e para respeitar os fatos históricos, é necessário abordar esse tema com seriedade.

Uma questão de responsabilidade histórica

Fatos não se dobram a opiniões. A compreensão do fascismo exige distanciamento crítico e embasamento rigoroso. Neste artigo, basearei a análise em fontes primárias e secundárias, sobretudo na obra "A doutrina do Fascismo", escrita por Benito Mussolini em colaboração com Giovanni Gentile (MUSSOLINI; GENTILE, 1935). Não se trata aqui de opinião pessoal, mas da exposição de dados históricos conforme registros documentais.

Linha do tempo: A ascensão de Mussolini

Benito Mussolini nasceu em 1883, filho de um ferreiro socialista e de uma professora. Em 1901 formou-se como professor de ensino primário, mas sua verdadeira paixão era a revolução. Em 1902 fugiu para a Suíça para escapar do serviço militar, onde teve contato com líderes socialistas, inclusive Vladimir Lenin.

Entre 1910 e 1914, tornou-se uma figura influente no socialismo italiano, atuando como secretário do Partido Socialista em Forlì e redator do jornal Avanti. Contudo, durante a Primeira Guerra Mundial, rompeu com a linha pacifista do partido e passou a defender a entrada da Itália no conflito. Essa mudança custou-lhe a expulsão do partido. Em resposta, fundou o jornal Il Popolo d’Italia, com viés nacionalista e revolucionário.

Em 1919 fundou o grupo "Fasci di Combattimento", que mais tarde se transformaria no Partido Nacional Fascista, fundado oficialmente em 1921. Sua ascensão culminou na chamada Marcha sobre Roma (1922), com apoio de milícias paramilitares conhecidas como camisas negras. Em 1925, Mussolini assumiu plenos poderes como Duce, instaurando a ditadura fascista na Itália.

A ditadura fascista: repressão e totalitarismo

A partir de 1925, os traços autoritários do regime tornaram-se evidentes: partidos opositores foram banidos, a imprensa foi censurada, e o poder judiciário foi instrumentalizado pelo Estado. A pena de morte foi restaurada, e tribunais especiais foram criados para punir adversários políticos. Em 1939, a Câmara dos Deputados foi extinta, substituída por um conselho fascista.

A juventude italiana foi mobilizada por meio de organizações estatais, que buscavam moldar os valores das crianças e adolescentes conforme a ideologia do regime. O lema era claro: “Crer, obedecer e combater” — exaltando o Estado acima da família e da fé.

O conceito de fascismo segundo Mussolini

Mussolini escreveu:

“A guerra foi revolucionária, no sentido de que com um jorro de sangue mandou embora o século da democracia, o século do número, o século das maiorias e das quantidades” (MUSSOLINI, 1935, p. 12).

Essa afirmação demonstra o desprezo do fascismo pelas instituições democráticas e pelos princípios do liberalismo. A visão fascista era reacionária, antiliberal, antiparlamentar, antidemocrática e antissocialista. Como observou o filósofo Rafael Nogueira, é necessário contextualizar os conceitos históricos para compreendê-los corretamente:

“A partir do momento em que lemos um texto que está relacionado a algum aspecto histórico, é necessário que os conceitos sejam usados de forma contextualizada à época para entendermos o que eles queriam dizer com isso” (NOGUEIRA, 2020).

Origem do termo e seu símbolo

A palavra "fascismo" deriva de fasci, que significa “feixe” em italiano. Na Roma Antiga, o fasces era um símbolo de autoridade — um machado cercado por varas de madeira, indicando união e poder. Era utilizado pelos magistrados como emblema do poder de punir. Em meados do século XX, o termo passou a representar os movimentos revolucionários que buscavam combater, com violência, seus inimigos políticos.

Contexto histórico: crise do liberalismo

O início do século XX foi marcado por forte rejeição ao liberalismo econômico. A crise de 1929 intensificou a descrença nas democracias liberais, criando espaço para regimes autoritários como o fascismo, o nazismo e o stalinismo. Embora com ideologias distintas, essas formas de governo compartilham elementos fundamentais:

  • Líder carismático e autoritário;

  • Partido único;

  • Culto à personalidade;

  • Controle da economia;

  • Supressão da liberdade de imprensa;

  • Doutrinação educacional;

  • Violência institucionalizada.

Fascismo, comunismo e nazismo: primos totalitários

Fotomontagem: Mussolini, Stalin e Hitler

Apesar das diferenças ideológicas, os regimes fascista, nazista e comunista apresentaram características semelhantes: totalitarismo, centralização do poder, repressão à dissidência e supressão de liberdades civis. Mussolini sintetizou bem o espírito do fascismo ao afirmar:

“Tudo no Estado, nada contra o Estado, e nada fora do Estado”  

(MUSSOLINI, 1935, p. 22).

Essa frase ilustra a essência totalitária do regime, que pretende controlar todos os aspectos da vida social, cultural e econômica.

Conclusão: lições da História

Mussolini iniciou sua trajetória política como socialista revolucionário, com forte influência do marxismo. No entanto, rompeu com o internacionalismo socialista para fundar um regime nacionalista, que rejeitava tanto o liberalismo quanto o comunismo. Sua proposta era um Estado forte, absoluto e autoritário, que se sobrepunha ao indivíduo e à sociedade civil.

O uso banalizado do termo fascismo revela não apenas ignorância histórica, mas também desonestidade intelectual. A história deve ser tratada com seriedade, pois relativizá-la é abrir espaço para os erros do passado retornarem sob novas roupagens.

A internet, ao democratizar o acesso ao conhecimento, oferece uma oportunidade inédita: aprender com profundidade, ir além dos memes e dos rótulos. Só não aprende quem não quer.


Referências

MUSSOLINI, Benito; GENTILE, Giovanni. A doutrina do Fascismo. 1. ed. Firenze: Editore Firenze, 1935.
NOGUEIRA, Rafael. Fascismo: conceitos, origens e distorções. São Paulo: Vide Editorial, 2020.

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